domingo, 16 de março de 2014

O JOGO

Aldo Zottarelli Júnior


Era um domingo como um outro qualquer naquela cidade do interior.
Saio de casa pela manhã e vou até ao supermercado do primo da minha mulher para comprar bolacha champanhe para ser colocada como recheio num pavê de chocolate. 
Dentro daquele pequeno mercado, a maioria das pessoas falavam no tal jogo de futebol que seria realizado à tarde entre uma equipe local e um grande time paulista.
As críticas positivas ou negativas eram feitas uma a uma, e eu fiquei a observar  as opiniões que iam e vinham sobre o possível resultado da comentada "porfia"- gostaram?
Lembrei-me de que na cidade há dois times de futebol profissional e as suas torcidas são extremamente fanáticas.
Na história de um desses clubes, houve um diretor tão dedicado que o seu nome é hoje a denominação do estádio desse clube. Ele costumava acompanhar, pessoalmente, os jogadores da sua equipe aos jogos realizados em outras cidades, e ao término deles passava o resultado via telefone, comentando a "performance" de seus jogadores. Numa dessas informações, para demonstrar o grande amor pelo seu time do coração ele afirmava que a sua equipe  havia "perdido bem".
- Como perdeu bem?, eu perguntei.
A explicação foi a seguinte: os jogadores jogaram muito bem, mas perderam. Perderam de cabeça erguida!
- Perderam de quanto?
- Cinco a zero!
E perderam bem, pensei.
A minha cidade sempre teve pessoas apaixonadas pelo futebol e naquele domingo a coisa fervia em todos os cantos.
A meninada jogava seus "rachas" pelas ruas, vestindo as camisetas iguais as dos times da cidade, assim como muitas pessoas também sentiam-se honradas usando as camisas azul e branca ou vermelha e verde, cores de seus clubes.
As bancas de jornais e revistas estavam cheias de compradores na busca de notícias e informações sobre o jogo da tarde. 
Os aperitivos servidos nos bares prestavam, naquela manhã, a sua colaboração, servindo as suas bebidas acompanhadas com papel/guardanapo nas cores azul e branca, e com a estampa do distintivo do clube local que iria jogar.
No almoço das famílias, o assunto era o jogo da tarde. Os diversos palpites eram feitos e todos queriam opinar e aguardar ansiosamente para ver o espetáculo.
Era incrível o que se passava com os habitantes da cidade que não mediam esforços e nem se preocupavam com o que os outros viam em suas condutas. E tudo por causa de um jogo.
Na sala de espera da maternidade estava um futuro pai roendo as unhas de suas mãos, aguardando alguém sair do centro cirúrgico  e trazer a notícia tanto esperada. Quando isso aconteceu, a enfermeira não encontrou o pai do menino que nascera e, em seu lugar, havia um bilhete: "fui ao jogo!".
O futebol corria nas veias de todos.
- Precisamos ganhar para irmos às semi-finais- dizia um torcedor, e continuou - se empatarmos, teremos que esperar os resultados dos outros jogos.
- Vamos ganhar de qualquer jeito - afirmava outro fanático cidadão.
Esse era o conteúdo das conversas e "bate papos" em qualquer canto da cidade. O jogo parecia ser um caso de vida ou de morte. Ou da polícia?
Esta também já estava com os seus pelotões de soldados na arena do jogo.
- Se formos derrotados, só iremos jogar no próximo ano. Já imaginaram ficarmos sem o futebol do nosso time até o ano que vem? - era a pergunta que todos faziam.
- Que nada! Vamos vencer e vamos para a cabeça. Esse é o jogo das nossas vidas - era como pensava a maioria. 
Olhar para o relógio à procura das horas e esperando o momento do jogo, era um fator pessoal de cada torcedor.
As horas se passavam e a aflição aumentava. O  coração de cada torcedor já iniciava uma aceleração, perigo de problemas coronários que estavam sendo expostos.
Trinta minutos antes do início do jogo, os seus jogadores já estavam se aquecendo com várias bolas e observados com alegria pelos torcedores, que eufóricos lotavam todos os espaços do estádio municipal.
De repente, todos os atletas desapareceram, voltando para os seus vestiários.
Quinze minutos depois, os dois times adentram novamente o gramado da disputa e cada jogador está de mãos dadas com crianças uniformizadas como eles e sorrindo para toda a plateia.
No meio do campo, o juiz, bandeirinhas e auxiliares chamam os capitães das duas equipes que se cumprimentam e fazem o sorteio do campo de defesa para cada equipe.
Em seguida, somente os jogadores que irão iniciar o jogo formam uma única fila de frente para a bandeira nacional hasteada naquele estádio.
Ouve-se o Hino Nacional Brasileiro. A maioria das pessoas ficam em pé e  cantam como se fosse o hino do jogo. Muitos  se mantém calados e observam atentamente os artistas da bola que estão perfilados e concentrados no som do hino e pensando, talvez, como enfrentarão os seus adversários.Ao final do hino,todos aplaudem. O jogo irá começar.
Os onze jogadores se deslocam e ocupam seus respectivos lugares no gramado verde, enquanto que os bandeirinhas e auxiliares se dirigem para seus campos de ação. Tudo está pronto para o tão esperado Jogo.
O juiz olhou para os seus auxiliares e estes lhe acenaram com um sinal positivo.
Em seguida, ele apitou o seu instrumento de trabalho. . .
o jogo começou.

O autor é educador, escritor e músico
e mail: aldozottarellijunior@gmail.com



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