segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

NÃO SOU E NEM ESTOU.

Aldo Zottarelli Júnior

Agora neste instante, neste salão que mais parece um refeitório, comecei a entender o que significa o" não ".
Você sabe o que é o "não"?
Pois é, agora eu sei e muito bem.
Vou tentar explicar:  pense em algo possível de acontecer.
Pensou?
Vou exemplificar:  acordar, após uma noite bem ou mal dormida, é algo possível de ocorrer com qualquer pessoa. Concorda? Entretanto, se você não dormiu, jamais o acordar existirá. Duvida? Tente!
Então me explique: como eu vou acordar se eu não dormi. Incrível, não é?
Relaxe um pouco e reflita sobre isso.
Vamos ao problema, Como deixar de pensar se o "pensar" é simplesmente impossível de ser abandonado ou esquecido, não é? Por isso mesmo, é lógica a possibilidade de você achar que eu estou patinando na maionese, ao  falar essas  coisas sem nexo.
Tal possibilidade passou a ser grande. Que nada! Passou a ser enorme.
Mas vamos em frente porque atrás vem gente. E como vêm. Será?
Somente pode discordar dessa afirmativa quem vive solitário em algum deserto, neste mundo de loucos. Ou não é?
Besteira! Como posso afirmar ser este um mundo de loucos se acabo de citar a existência  de uma única pessoa vivendo num deserto. Se ela está só ou vive na solidão, afirmo e confirmo que o mundo é de "loucos".  Onde fui buscar o "plural" para juntar a esse alguém  que vive só neste mundo? Pois é!
 Voltando à frase " atrás vem gente",  eu pergunto: e se ocorrer um vazio e ninguém aparecer?
Possivelmente a coisa ficará complicada, não é?
E se você me questionar:  fica o quê? Como?
Como resposta, posso ficar em silêncio.
Novamente você pensará que eu perdi o "fio mental da meada" e, por isso, me atrapalho todo ao tentar explicar o que é praticamente inexplicável, ou seja, afirmar que o "não" é tão somente "não" e estamos conversados.
Nada disso. Tem que haver uma explicação para a existência do "não". Tem que existir essa explicação, porque   desde que haja um "sim", é inevitável a existência de um "não".
Engraçado!  Até agora, nem eu e nem ninguém falou sobre a palavra: "sim".
Ora, se não existe o "sim", não existirá o "não". Ou vice-versa.
Para que o nosso pensamento não entre em parafuso sobre o que eu estou contando, precisamos começar tudo novamente.
Não! Começar de novo, não!
Olha ele aí, outra vez, todo charmoso e cheio do TSA.
O que é TSA?
Significa: "Tá Se Achando", tipicamente impróprio e inoportuno, como a palavra "não".
A  roupagem negativa do "não" impressiona quem passa o dia todo tentando descobrir o conteúdo do espaço existente dentro da cabeça de qualquer mortal. Não é fácil mas é verdadeiro, concreto, real.
Se isso deixar de existir, deixará também de existir aquele que pensa que é e não é. Foi!
O mesmo acontece quando demonstramos a fixação de um estado emocional.
O antes partiu, deixando o momento vazio para ser ocupado pelo "ser" ou pelo "estar".
Porém, se não conseguimos entender as explicações sobre o uso da palavra "não" é porque estamos lendo algo e pensando em outro algo muito distante. A consequência desse pretenso desajuste está na relação direta da coordenação da nossa mente  com o  nosso infinito íntimo e, com isso,  é bem possível que deixamos de existir ou de sermos o que fomos.
E pensar que tudo isso saiu da tentativa de se buscar uma explicação simples sobre a existência do "não". Parei!
Ouvi o som de uma campainha tocando.
Naquela sala, todos se movimentam e se mostram vestidos com pijamas semelhantes de cor branca, como se estivessem uniformizados.
Começo a entender que eu não sou e nem estou em lugar algum. Aqui o "não"prevalece, com certeza!
Ainda mais, no refeitório de algum sanatório. . .

O autor é educador, escritor e músico.
Agendar palestras e conferências no
e mail: aldozottarellijunior@gmail.com

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

A EXPECTATIVA DE VIDA

Aldo Zottarelli Júnior


Posso e devo afirmar que uma das coisas mais difíceis de aceitar é quando perdemos algo que sabemos que não iremos encontra-lo mais.
Imaginem quando se perde um amigo levado pela morte.
É como se um pedaço de nós desaparecesse.
O coração dá uma rápida batida e pensamos que podemos ter algum "caco"ou "treco"e nos vem a nítida impressão de vamos partir também.
Está claro que os anos passam por e deixam sempre algumas rugas em nossa face, nesse movimento que  conhecemos como idade a quem culpamos os nossos erros repentinos.
A ciência já nos explicou que o tempo de vida dos mortais está em constante mudança para maior. Se há quinze anos, a expectativa de vida era de sessenta anos, hoje essa mesma expectativa alcançou os oitenta anos. Agora podemos viver mais um pouquinho. Entretanto, se alcançamos um sucesso ao encontrarmos novas curas, reconhecemos que descobrimos maneiras de se viver mais. Porém, outras doenças vão surgindo na decorrência da ampliação do tempo do envelhecimento do nosso corpo e assumem a grande culpa pela queda e pelo enfraquecimento da nossa saúde. Está mais do que comprovada esta teoria. Daí, a imensa procura por métodos de exercícios físicos, com ou sem aparelhos, na busca permanente de se tentar ganhar mais saúde e viver, se possível,eternamente. 
Os anos continuam passando e nós  somente percebemos quando ouvimos a má notícia do falecimento de algum amigo ou conhecido com a nossa idade e convivência.
Pelas ruas, avenidas, jardins e praças notamos sempre a falta de alguém ou de amigos que não veremos mais. O cenário de hoje é diferente daquele de alguns meses antes.
Então, podemos pensar que estamos na lambuja da expectativa de vida. Pode ser, diria o doutor Carlos, amigo de infância, afirmando: "Tomem cuidado! Não sabemos o que acontecerá amanhã"
Essa dúvida dita por um médico de prestigio me deixou mais atônito com o que estou vendo e vivendo. Lembro-me da frase de alguém afirmando que: "estava morrendo gente que nunca morreu". Até parece piada,mas não é porque ela poderá representar cada  um de nós que ainda estamos vivendo.


O autor é educador, escritor e músico
e mail: aldozottarellijunior@gmail.com  

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

O QUARTO AZUL

                                                    Aldo Zottarelli Junior

Aqui estamos nós.
Você queria que tudo terminasse de maneira simples e que deixássemos aos outros  a oportunidade de saberem porque escolhemos este final.
Lembro-me que a idéia nasceu de um conto de Fiódor Dostoievski onde alguém, com ciúme doentio da sua amada, resolveu buscar na fria cor azul a pintura do fim das suas  vidas.
Interessante. Parece que a mesma coisa esta acontecendo com você e comigo, neste instante.
Prometi a você que eu também pintaria todo o nosso quarto de azul e tudo mais que estaria disposto em moveis, cama, cadeiras, paredes, forro e chão. Assim foi feito e você gostou. Lembra? 
Não! Você não pode me dizer agora se gostou porque, há alguns minutos, a sua respiração acabou e o seu corpo permaneceu deitado, quieto e sem vida, aqui ao meu lado. 
Igual a nossa cama e lençóis, você está vestida de azul.
Apenas o seu rosto, seus braços e os seus pés não eram azuis. Foi então que tive a idéia de pinta-los de azul, depois da sua partida. Assim, tudo ao nosso redor, neste nosso quarto, ficou completamente azul.
Fechei os meus olhos e tentei lembrar o que havia acontecido com o nosso amor que começou quando estávamos no colégio. Foi tudo bonito. De lá para cá juramos um amor infinito e mantivemos a nossa fidelidade autêntica, sem qualquer deslize e nem traições. Sempre fomos assim, dois apaixonados que juraram manter essa paixão para sempre. 
Não tivemos filhos porque isso não estava escrito em nossas vidas. Mas o amor que sentimos um pelo outro jamais houve outro igual neste mundo.
Quando, em seu leito do hospital, o médico nos disse que o seu caso seria difícil de apresentar qualquer cura e que teríamos de orar na busca de um milagre impossível, resolvemos voltar para este quarto só nosso e ficamos na espera do milagre impossível  prometendo mudar para a outra vida juntos e nos amando cada vez mais.
Sinto que você já partiu e deve estar me esperando.
A droga que apliquei no meu braço esquerdo também tinha a cor azulada como todo o meu corpo também pintado da mesma cor.
Começo a sentir uma pequena dificuldade para respirar porque a droga começou a fazer o efeito em mim.
Viro-me para o seu lado e olho para o seu rosto, quieto, azul e sorrio. Em poucos instantes estarei com você e juntos caminharemos para o infinito azul de nós dois.
O último movimento do meu braço direito foi para abraça-la. Talvez o nosso último abraço.
Não sinto mais as minhas pernas e nem os meus braços. Somente a minha respiração ainda demonstra a existência de alguma vida na cama. Porem, com dificuldades, tento respirar fundo e percebo que não vou conseguir. . . 
Foi o meu último suspiro. 

O autor é educador, escritor músico.
e mail: aldozottarellijunior@gmail.com