segunda-feira, 30 de setembro de 2013

DUAS ALMAS.

                                                    Aldo Zottarelli Júnior

Eram duas almas que nasceram e viveram juntas.
- Como é bom - disse uma delas - que estamos vendo esse mundo todo se mexendo ou balançando de um lado para outro.
- É verdade! Tenho observado que já fomos bonitas e agora a cor dos nossos corpos está ficando muito amarelo e o verde da nossa saúde está se acabando.
- É uma pena mas é a regra geral da vida. Fazer o quê?
Conversando bastante, as duas almas contavam o que observaram naquele local onde elas surgiram e que proporcionava a cada uma delas uma experiência de vida.
- Veja você, companheira de todas as horas, ontem, pela manhã, nos vimos o casal que ficava sempre ao nosso lado, mudar totalmente de cor e bem secos e enrugados caírem sem ninguém tentar salva-los.
- Olha os dois deitados no chão. É possível que, no final da vida deles, o crematório seja a sua última morada ou eles sejam esquecidos debaixo da terra.
Naquele momento, um vento forte bateu nas faces das duas amigas.
- Cuidado querida que esse tipo de vento pode nos derrubar.
- E do chão nós não passamos, não é?
- Ainda mais agora que estamos idosos e sentindo a cada ruga que aparece em nosso corpo a mudança do verde-saúde para o amarelo-doença.
- Ou para o marrom, ou champagne, ou vermelho. . .
- Seria ótimo se fosse vermelho porque é bom lembrarmos que os pigmentos vermelhos, chamados de antocianinasque podem trazer uma proteção contra a radiação solar intensa, garantindo o fenômeno da fotosíntese que geram energia. 
- É por isso que algumas árvores fiquem com as suas folhas avermelhadas?
- Sim.
- Você se lembra quando as pessoas vinham em nossa direção e se sentavam à nossa sombra, sem perceberem que nós tínhamos vida e sentíamos tudo o que acontecia.
- Quando eram casais de namorados, os  beijos apaixonados e as declarações de amor eram constantes. Lembra? 
- Era mesmo. Agora, que estamos amarelecidas e com a contagem caminhando para o final, não  conseguimos mais ouvir ou ver os momentos de paixão entre duas pessoas.
- Infelizmente outra rajada de vento frio se aproxima e o nosso amarelo vai virar uma cor praticamente sem vida e os nossos corpos vão ficar rígidos e facilmente quebráveis.
- É uma pena que isso venha a acontecer. Aliás está acontecendo. Não podemos nos esquecer que pertencemos a uma família famosa denominada de álam. . .
Fez-se silêncio.
- Querida! Onde você está?
Olhando em direção ao chão, a amiga viu que as forças da sua companheira haviam terminado e ela não conseguiu se segurar ou se equilibrar no galho onde estavam e caiu mansamente, repousando discretamente no chão. Silenciosamente, morta!
Em seguida e chorando, a outra flor de álamo caiu de tristeza e juntou-se com a  companheira de sempre. 
Mortas, as duas folhas ficaram abraçadas como duas almas amantes até que um vento mais forte desmanchou aquela união enviando cada uma delas para lugares diferentes.
Mais tarde, uma cremação ao pé da árvore em que viveram foi feita por um desconhecido. Elas se foram para sempre com a fumaça daquela queimada. 
Era o outono que havia chegado e, logo depois, viria o terrível inverno.

                                 O autor é educador, escritor e músico.
                                 Agendar conferencias e palestras no 
                                 e mail: aldozottarellijunior@gmail.com
                               

Nenhum comentário:

Postar um comentário